domingo, 24 de maio de 2009

[Conto] A verdade sobre uma mentira

Aqui estão eles.

Sabiam que tudo que sentiram um pelo outro evaporara. Tornara-se primeiro um sentimento tênue, depois, corroído pelo tempo, virara uma amizade efêmera e agora aqui estão eles.

Ela dentro de casa, olhando-o partir num táxi. Em seu rosto uma expressão de dolorida liberdade toma conta. Não gostava dele, não mais. Ele não a fazia rir como antes, não a tratava bem como antes. Em verdade ele se tornara um pedaço de cavalo aqueles últimos meses. Quando tentava agradá-lo recebia um coice tremendo. Quantas vezes não fora correndo se trancar no quarto para chorar?

Ela acha que ele tem uma amante. Ele não a procurava mais, há quase três meses que não faziam sexo, três meses!

Sabe quanto tempo é isso para um casal sozinho, sem filhos? O tempo se desdobra, deixa de existir. Um dia parece um ano, um ano parecem dez, dez anos parecem uma eternidade. No caso dela uma eternidade de tormento.

Agora, vendo o táxi sumir numa curva ela se questiona se realmente amou aquele homem, aquele canalha.

Uma lágrima quente escorre pelo canto esquerdo de seu rosto e ela enfim se rende.

Chora.

Ajoelha-se.

Encolhe-se no chão.

As lágrimas parecem não querer parar de fluir. Um dilúvio bíblico.

O que será dela agora? Como prosseguir?

Não sabe.

Então, assim como as lágrimas vieram elas somem.

E ela, enfim, tem certeza de uma coisa.

Tem certeza de que tudo que ouvira e experimentara até aquele dia não passara de algo falso.

Tem certeza de que nunca amou aquele homem.

Tem certeza de que, no fundo, sempre foram apenas conhecidos.

Tem certeza de que o único sentimento afetivo verdadeiro é a amizade e tem certeza, também, que isso nunca faltará a ela.

***

Ele, olhando para a casa que um dia fora seu lar, olhando para a mulher que um dia fora sua esposa.

O que vê em seu rosto não diz nada para ele, apenas o empurra mais para o fundo do interminável poço escuro em que caiu.

Ela não entende sua decisão de sair de casa, disso ele tem certeza, mas como poderia continuar lá? Ela não entendia seus anseios, suas vontades, suas necessidades. Ela não entendia que poderia perder (como perdeu) o emprego. Ela não parava de encher seu saco.

O táxi em que estava virou a curva e ele viu pela ultima vez a mulher que um dia chamara de meu amor.

Uma música calma tocava na rádio, o motorista tentava puxar assunto, seu celular tocava.

Nada disso importava. Não, nada, exceto a vida que um dia viveu.

Olhava para todos os lados, mas não achava saída.

Em desespero ele começa a chorar.

- Pare aqui, por favor. –Pede.

O táxi para, ele desce.

Anda meio quarteirão, desolado.

Tudo desmoronara. Tudo aquilo que suara tanto para conseguir.

O que sua vida valia agora? Um real? Dois? Cinquenta centavos?

Não sabia e nem queria saber.

Acabara de achar aquilo que estava procurando: um bar.

Ele entra e pede uma cerveja.

Inconformado, pede mais outra. E mais outra. E mais outra.

Vendo que nada faz efeito decide partir para algo mais forte, uma cachaça talvez?

Vira uma, duas, três, cinco, dez, quinze rodadas.

Tão bêbado quanto um homem poderia ficar,ele cambaleia até a construção do metrô e para na ponta do enorme buraco escavado.

Imagens do seu tempo como ser humano passam por sua cabeça bêbada. Festas, risos, paixão, tudo isso é passado.

Num ultimo pensamento, ele grita, com toda a força que sua garganta ébria consegue atingir:

- Eu te amo!

E então ele sente apenas o vazio, enquanto cai para seu fim.



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