domingo, 11 de março de 2012

Crônicas de uma Realidade: Início e Fim

Em frente ao corpo murcho da Realidade, diante dos pilares sujos de sangue, no meio da clareira de terra pálida, Ficção ria. Ria como uma criança, como um demônio, como um sábio. Gargalhava tanto que suas extremidades formigaram. Gargalhava com tanta vontade que não percebeu as figuras sem forma em volta do corpo de sua irmã. Entre uma rajada de risos e outra cacarejava frases como “eu te disse!”, “como você era patética!” e “vê? Estou viva, os pilares estão de pé e aquela maldita bola azul ainda está lá encima!”.

De repente cessaram os risos. A face da Ficção estava triste. Era uma criança que acabara de perder toda a sua família. Lágrimas fluíam por sua face pálida. Deixou-se cair no chão e em silêncio regou aquela clareira estéril.

As duas figuras sem forma deslocaram-se até a fratricida e lhe levantaram pelos braços.

- OLHE – disse a presença a sua direita – OLHE PARA A ESFERA. O QUE VÊ?

- destruição – falou a presença a sua esquerda – você iniciou o processo de destruição.

Rosas escarlate contrastavam com o azul dominante.

- FRATRICIDA!

- fratricida!

Nesse momento a Ficção assumiu uma identidade solene de viúva. Olhou para a esfera e sorriu amargamente.

- LOUCA!

- ingênua!

- Vocês também não entendem, não é? – baixou a cabeça com resignação – tudo bem, vai acontecer tudo outra vez. Façam o seu trabalho.

Ao término dessa frase as duas figuras se uniram num abraço cósmico e engoliram toda a clareira.

Início e Fim reviveram os primeiros momentos da existência nessa rápida união eterna. Viram a criação da esfera, a forja dos pilares, o crescimento da floresta ao redor.

Início e Fim recriaram, em poucos instantes, o que havia se perdido há eras.

Início e Fim desapareceram como apareceram, deixando para trás dois bebês.

Duas irmãs.

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