domingo, 27 de fevereiro de 2011

O Mito do Bom Amante

Depois de muito pensar, refletir e ponderar sobre a continuidade deste blog resolvi mantê-lo ativo para o bem geral da nação (e da minha sanidade). E é com este intuito que postarei esse texto sobre um fenômeno que sempre me deixou atônito por sua superficialidade e, paradoxalmente, pela profundidade que suas raízes atingiram no âmago da sociedade média contemporânea: O Mito do Bom Amante (ou A Lenda da Pessoa Certa, como preferirem).

Primeiro uma ilustração da expressão mais corriqueira dessa lenda:
Maria ouviu durante toda a sua infância contos e histórias sobre princesas que sofriam nas garras de bruxas más, dragões e madrastas e como sempre eram salvas pelo príncipe encantado, que com um golpe de sua nobre espada dava um jeito nos vilões e que com um (na verdade O) beijo levava a história pro caminho do "viveram felizes para sempre".
Passados alguns anos, agora adolescente, Maria vê filmes em que a mocinha, sempre tida como feia e desengonçada, resolve sua vida e dá a volta por cima ao encontrar o galã, que a mostra que o que importa é o que há por dentro e não o que os outros vêem ou pensam. Ela se encanta com essas histórias melosas, sempre repetitivas, e não entende por que nenhum de seus relacionamentos conseguiu atingir esse ápice de afeto e carinho, sempre terminando em desilusão para ela. Nenhum de seus príncipes a levou para o sonhado VFPS ("viveram felizes para sempre"), mas tem fé que um dia há de encontrar O homem ideal.
E assim se passam os dias, os meses, os anos. Maria, 28 anos, formada, bem sucedida e... virgem. Não por ser feia, desengonçada, sem graça, não, não, nada disso! É que ela ainda não encontrou o seu Príncipe (que agora chama apenas de Homem). Suas amigas e seus amigos vivem, em sua maioria vidas conjugais estáveis e relativamente felizes (isso, por sinal, é motivo para outro texto depois!) e não entende por que ela não pode ser igual. Maria, 28 anos, formada, bem sucedida, virgem, sexualmente e emocionalmente frustrada.
Maria, 85 anos, casada há 50, aposentada, dois filhos, infeliz, frustrada sexualmente e emocionalmente. Ainda busca seu Homem.
Maria, 86 anos, morta, depressão. Causa? Provavelmente seu terapeuta irá dizer 1001 razões, seu médico mais 2000, mas eu lhe digo uma e apenas uma: não atingiu o VFPS.

Depois dessa historinha aparentemente fictícia (quantas "Marias" não conhecemos?) e melancólica eu vos pergunto leitores: Por que essa fixação no VFPS? Por que, mesmo passando a vida inteira imersa em sombras, frustrações e auto-repreensões, Maria não se libertou dessa idéia implantada em sua mente quando ainda era apenas uma criança?
A resposta para essa pergunta pode ser usada também para solucionar enígmas seculares como o dos adeptos do socialismo/comunismo, o dos fanáticos religiosos, das práticas estéticas de rejuvenescimento... enfim, de quase todos os objetivos supremos.
É uma resposta que de tão símples foi transformada em obscena, nefanda: Por que é ideal, e dessa forma é algo inatingível na esfera humana.

Sim leitores, é só isso. Nada mais, nada menos.

E agora a lógica te faz indagar: por que não revelam isso logo de uma vez e acabam com essa praga que corrói as fracas almas medíocres?
Porque (e sinto uma tristeza profunda em dizer isso) mesmo que destrocemos esse mito outro, provavelmente pior, virá e se interrará nos confins obscuros do subconsciente, de onde quase nada poderá tirar.

Nós humanos somos assim. Nós próprios construimos a máquina de nossa vida e semeamos a fruta da auto-destruição.

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