segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Crônicas do Esquecimento #2: Ecos


- Rápido, a antena! Consertem a antena!

Gritava comandos como esse todos os dias agora, embora soubesse que pouco ou nada adiantava: as máquinas já não funcionavam de acordo com a vontade dos homens. De nada adianta consertar o que não está quebrado.

Há um mês as máquinas começaram a não executar suas funções. Há um mês a humanidade voltava gradativamente à Idade Média. Religiões começaram a anunciar o fim dos tempos (ou será que nunca pararam?), o êxodo urbano surpreendia cada vez mais, cidades industriais iam pouco a pouco se tornando cidades-fantasma. Também nunca se tinha visto índices de suicídio e homicídio tão altos na história da humanidade.

Caos, caos total e interminável. E ele ali, em relativa paz com o que sobrou de seu time de técnicos e engenheiros dentro daquele habitat hermético da NASA.

- A antena! Não podemos ficar sem contato com os astronautas!

Mas sabiam que a uma altura daquelas já deveriam estar mortos. A não ser que as máquinas não estivessem se recusando a trabalhar fora do planeta...

Essa mais recente expedição à lua foi um erro, em sua opinião. “É necessário reafirmar a América como líder mundial e, por que não, do sistema solar!” disse seu diretor na cerimônia de lançamento da espaçonave Icarus III. Onde estava ele agora? Deitado sobre sua mesa, com pequenos pedaços de seu cérebro e sangue espalhados pelo carpete azul de sua sala, iniciando o processo de decomposição.

- Vamos, a antena, merda!

Mas sabia que tudo o que fizesse seria inútil.


***


A comunicação com a Terra estava cortada há três dias, o sistema de reciclagem de oxigênio estava quase parando, não havia mais água potável, mas haviam chegado à lua novamente. 

“Não importa que tenhamos chegado aqui se todos amos morrer de fome, sede ou asfixia! Temos de tentar consertar nossos sistemas de sobrevivência!” insistia um de seus colegas. 

Mas nada havia para ser consertado.

Não tinham como sair dali, ela bem sabia.

Por isso ali estava, sozinha e com um dos poucos objetos eletrônicos (além dos trajes e luzes elétricas) que ainda funcionava. Desplugou o canal de áudio interno e conectou seu pequeno e antigo I-Pod.

Nesse momento uma sombra se fez perceber nas areias pálidas, ao seu lado. Era ele. Abraçaram-se longa e desajeitadamente, por causa dos trajes, mas, através do capacete dele, ela pôde ver o sorriso que tanto gostava encimado por aqueles olhos ora sérios, ora brincalhões, mas sempre sinceros.

Um não podia ouvir o outro, mas a música que tocava em seu traje falava por ambos e se comunicava em ecos intermináveis com a infinitude escura, fria e amedrontadora que os rodeava.

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