domingo, 31 de outubro de 2010

Luto...

... pois o povo brasileiro (vulgo bois e babuínos) escolheu a Morte* como ideal.


E a verdade é: Em terra de cego, surdo e burro quem tem olhos, ouvido e cérebro é defunto decaptado.

* Agora acho que quem quiser entende qual o assunto tratado por mim em "Entre Mortos e Feridos"... ou não.

domingo, 24 de outubro de 2010

"I Love My Colony!"

Bela colônia vocês tem aqui!

- Colônia? Mas nós estamos independentes há 186 anos!

Sério?! Nossa! Desculpe, devo estar com uma terrível miopia mental. É que quando olho para vocês nativos e para seu governo eu tenho a nítida certeza de que estou em uma colônia de fim de mundo!

- “Vocês nativos”? Ora, porra, e você nasceu aonde? Não foi aqui não? E que onda é essa que você tá falando?

Putz, desculpa mais uma vez. É que não consigo reconhecer esse pasto como minha terra natal... Foi puro acidente geográfico eu ter nascido aqui.

- É o que? Cê é puta, é desgraça? Tá me chamando de boi, porra?! Bora, explica logo que lance é esse aí!

Não, pô, é que eu observo que absolutamente ninguém que é genuinamente filho dessa terra se importa com coisa alguma. Seja com a limpeza das ruas, seja com os bens públicos... Nem com o rumo da política vocês, babuínos, se preocupam. Fico realmente impressionado.

- “Babuínos”? C quer sair na mão, não quer? Cai pra dentro! Bora!

Um baiano, aliás, um brasileiro legítimo: Cego, burro e ignorante! Filho, esse paíszinho de merda, por causa de pessoas como você e como a corja que está no governo (e que tenta, passando por cima de tudo e de todos, se manter lá), é como uma puta. Perna aberta pra quem quiser entrar e meter o pau. A questão é que agora essa puta virou crente e critica o mundo pra manter as aparências, mas no escurinho de um beco ainda recebe a madeira sifilítica de um árabe, de um cubano, de um venezuelano...

- Ahh sim, saquei sua parada. Cê é daqueles que gosta de política, né? Não curto isso não, é chato pra caralho.

Isso, isso. Vá ralar sua shana no asfalto, vá descer com seu tabaco no chão, vá beijar na boca.

Macaco.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Entre Mortos e Feridos...*

A incerteza da morte ou a vida mutilada?

1ª opção: afundar em trevas incertas enquanto sente seus sentidos dizendo-lhe adeus para sempre, ou não. Ficar sujeito a qualquer coisa que haja do outro lado, ser peão sem voz.

2ª opção: continuação capenga e infeliz daquilo que você deixou, sujeito ao esquecimento e ao ostracismo, comensais da solidão. Dizem que se vive bem sem uma mão, sem um pé, sem um olho. Mentira.

3ª opção (perda da honra, se é que ainda existe isso hoje em dia): fugir da obrigação e desertar, pensando se eximir da culpa da situação dos outros, mas se torturando por não ter mostrado para que veio.

Na verdade, entre mortos e feridos foderam-se todos.

Não há uma melhor escolha, há apenas o ruim e o pior (que varia de acordo com o ponto de vista).


* não creio que muitos entendam qual é o tema desse texto, que está muitíssimo polissêmico, mas essa é a graça de escrever.

sábado, 9 de outubro de 2010

Esclarecimentos

Acho que devo algumas explicações aos visitantes e eventuais leitores (raras almas, tenho consciência) sobre alguns termos e temas que faço uso. Sei que, para quem entende meus textos, não há necessidade alguma disso, mas também sei que são pouquíssimos os que se enquadram nesse grupo.
Como podem perceber eu tenho uma certa fixação no “concreto cinza”, em como evitá-lo, em como combatê-lo, em identificá-lo no cotidiano das grandes – e cada vez mais nas pequenas – cidades. Não gosto do convencional, não gosto do pré-formatado. Para mim ser como “todo mundo”, ser “normal” é repulsivo, me dá ânsia, angústia, entendem? E, por causa dessa angústia, não consigo ficar calado (na verdade não consigo entender) quando vejo os caminhos cada vez mais asfaltados, cada vez mais urbanos, cada vez mais sóbrios que a humanidade toma.
Às vezes preferia, sinceramente, ser mais uma máquina de produção. Não sofreria com a decadência ácida. Muito pelo contrário, ficaria feliz, acharia tudo lindo, brilhante (mesmo sendo cronicamente cego), teria os mesmos sonhos e aspirações que todos os outros, apenas trocando alguns detalhes genéricos desimportantes. (Na verdade não. Não desejaria ser um macaco mecânico. Acabaria caindo no fogo infernal dos conhecimentos banais excessivos... Gastaria uma encarnação apenas para manter a roda de concreto girando.)
Enfim, deixando as prolixidades de lado, meus textos sempre serão metáfora do vazio que nos permeia, sempre serei poeta da desolação em massa (e da massa), da insignificância de uma vida para o universo (coisa que vem sendo mascarada, maquiada e escondida desde muito, muito tempo).
Não sou utópico. Sei que é preciso que existam dominados e sei que os dominadores são imprescindíveis em qualquer sociedade animal. A questão é que, com o passar dos séculos, tais dominadores foram escavando a terra e hoje batem à porta do núcleo do planeta, sem se tocar (ou até com uma vaga noção) de que se lá entrarem tudo desmoronará, tudo acabará.
Que diria Nietzsche se vivesse nos dias de hoje? Ele que, à sua maneira, também lutava contra o avanço do concreto cinza e que apontava seus principais erros estruturais (que já foram há muito rebocados e hoje apresentam máscara nova)?
Seja como for, ele não se resignaria. Nós também não o devemos.
O homem cinza é pior parasita que os homens de carne. Os homens de carne destroem por prazer, por medo, por tesão. Os homens cinza destroem por astúcia, por indiferença, pelo seu próprio ego.
Nós, homens de carne, somos animais. Eles, homens cinza, são criaturas anti-naturais.
É então que convoco-os: minemos, cada um ao seu jeito, a paciência, a astúcia desses seres. Ajamos como vermes em carne podre, comendo pouco a pouco a carne morta. Ajamos como parasitas de parasitas.
É isso que defendo, é disso que eu falo, é por isso que eu vivo.

Soneto do Eremita

Sob meus pés se destaca a areia morta
Sobre meu corpo se erguem martelos impuros
Perante meus olhos se posta a praga mansa
Dentes finos, cerrados, dedos longos, descarnados

E dessa praga nascem povos, e de povos legiões
É uma batalha perdida, é o peso de multidões
Que sentam em três peitos vivos e lhes tiram o ar
Semi-mortos, olhamos para tudo aquilo que já foi azul

Não me rendo, não me renderei!
Prefiro morrer nos olhos da Besta
Mas por favor, não me deixe ficar cinza!

Não me entrego, não me perderei!
Não sou prostituta dos céus de brita
Me mate, mas por favor, não me deixe ficar cinza!

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Intercessão de Vazios

Sentou-se em sua mesa abarrotada de papéis e apostilas com um prato minguado de comida insossa e um copo de energético do lado. Sua mãe reclamava, mas era preciso estudar, sempre! Dormir? Quem precisa disso? Relaxar? Isso é coisa de vagabundo! Ele não pode se deleitar com essa coisa de massa, com essa coisa de homens medíocres, afinal ele é superior! (Na verdade, na mais pura e tocante verdade, ele sente inveja dos que chama de medíocres e se detesta por isso. Seus amigos nunca seriam tão fracos a ponto de gastar um segundo pensando neles. É preciso matar e sepultar essa vontade de mediocridade e, senão isso, pelo menos escondê-la dos outros.)
Engole o jantar raquítico com rapidez e bebe dois grandes goles do energético. Precisa ficar acordado, precisa estudar!
Sente-se um pouco zonzo, sabe que não vem entendendo coisa alguma do que falam na sala de aula, sua cabeça parece cheia de finas lâminas de chumbo. Mas não importa, deve ser a ausência de sustança na comida que vem ingerindo nos últimos tempos. O que de fato importa é estudar. Tem que resolver todas as questões das apostilas, tem que se manter afastado do medíocre, tem que ser superior, admirado. (É um macaco inseguro carente de atenção, um ser inferior.)
Estuda. Vira a noite entre apostilas, equações e fiapos de borracha.
Ao amanhecer ele para, levanta e olha pela janela. Deseja o mundo que passa por suas retinas, deseja o reconhecimento, prêmios, entrevistas. Estudar, sim, estudar. Só com o estudo ele poderá começar do topo e sair do buraco social (e, pensa sorrateiramente, existencial) em que está imerso. (Pobre e podre macaco.)

* * *


…sobe. Desce. Sobe. Desce.
- Ah... vai... mais fundo... vai..!
Sobe. Desce. Sobe. Desce.
Levanta.
Sobe. Desce. Sobe. Desce.
Tombo.
Riem.
Vai. Vem. Vai. Vem.
Vai, vem, vai, vem, vai, vem...
Levantam.
Beijo.
Beijos.
Encaixam-se.
Vai. Vem.
Vai, vem, vai, vem, vai, vem, vai, vem, vai...
Vai vem vai vem vai vem vai vem vai vem vai vem vai vem vai vem...!!!!!
Vaivemvaivemvaivemvaivemvaivemvaivemvaivem levanta sobedescesobedescesobedescesobedescesobedesce.......................!!!!!!!!!!
Param.
Silêncio
Olham-se.
Ela levanta, ele fica na cama, deitado. Recosta a cabeça no travesseiro, sorri. Conseguiu pegar e comer a menina mais gostosa do colégio, vai porra!
Ela volta, foi tomar banho.
Ambos se deitam. Ela dorme logo, ele fica rindo para o teto.
Com o tempo o riso se esvai, os olhos fecham, o sono vem.
Em sonhos ele some ante o peso do mundo, ele corre para saber que não saiu do lugar, ele come e se sente vazio.
Em sonhos ele vê o real. Na realidade ele vê o sonho. (Alheio à verdade mais um macaquinho dorme disturbado.)

* * *

Festa.
O som alto agradava seus ouvidos, muito embora sua expressão facial indicasse o contrário. Tinha que manter as aparências.
Estava sentada com suas amigas em algumas das poucas cadeiras desocupadas. Era festa de quinze anos de sua prima e todos se divertiam. Menos ela. Tinha que sustentar a imágem de boa moça.
A conversa ia enjoada, enojada. Queria mesmo era dançar, mas o que diriam se a vissem fazendo tudo que deseja? Não, não! Melhor ficar quieta no canto mesmo. Qué que tem demais aguentar algumas horas de conversa chata? Faz isso todos os dias de sua vida. Já se acostumou.
Enquanto suas amigas falavam ela se concentrava apenas no som alto, na música baixo-astral que ela condenava, em como ela lhe dava vontade de dançar, ficar e (“Deus me perdoe!”) de transar! Nossa, era um impulso muito forte!
Mas não. Não, não, não e não. Não vai ceder, uma hora a vontade passa.
Mas não passou.
Fim da festa.
Todos os convidados já tinham ido embora e ela se despedia da prima. Ainda sentia aquela chama queimando seu baixo ventre, precisava chegar em casa o mais rápido possível!
Não adiantou, a chama ainda queimava, a consumia por completo. Tinha medo de deixar transparecer nas feições a sua vontade, tinha de se esconder!
Banheiro.
Nua, se olha no espelho. Sente desejo. Olha para a mão. Se olha.
Deus me perdoe...!
("Amém", diz o Macaco.)

* * *

Segunda-feira, monotonia rotineira.
Um senta-se já com o módulo aberto, fingindo estudar, para chamar a atenção de seus colegas, quer que venham lhe pedir ajuda, quer ser superior.
Outro conta, numa roda de amigos, como foi comer aquela menina, sente-se invejado, sente-se, em suas palavras, O Foda. (Mas de sua cabeça não saem os pesadelos terríveis que vem tendo.)
Ela mais uma vez imerge em conversas sem nexo, sem cor, sem gosto, sem prazer. Vez ou outra olha para sua mão e lembra-se do que fez (com orgulho? Com remorso?), sente vontade de sexo.

Se perguntados, muitos diriam ver uma sala de aula completamente normal, com seus núcleos e panelas.

Se me perguntam eu digo o que vejo: um infinito de vazios, todo um universo de vidas artificiais se cruzando, fingindo viver, mas apenas sobrevivendo.

Eu vejo uma intercessão de vazios.